Sex Education

Crítica: Sex Education é uma revolução ou apenas mais uma série querendo ser descolada?

Sex Education chegou como um furacão ao catálogo da Netflix, prometendo abordar sexualidade com uma abordagem didática, inclusiva e, acima de tudo, divertida. Com personagens cativantes e uma narrativa que mistura humor com reflexões profundas, a série rapidamente se tornou um fenômeno. Mas até que ponto ela é realmente revolucionária? Seria Sex Education uma mudança de paradigma ou apenas mais um produto que busca lucrar com o discurso progressista?

Sex Education e a quebra de tabus

Desde o primeiro episódio, Sex Education deixa claro que não se trata de uma série convencional sobre adolescentes. A trama acompanha Otis Milburn, um jovem introspectivo que, apesar da inexperiência, se torna um guru sexual em sua escola graças ao conhecimento que absorveu de sua mãe, Jean, uma terapeuta sexual.

O grande trunfo da série está na maneira como ela aborda questões muitas vezes marginalizadas ou tratadas com superficialidade em outras produções teen. Tópicos como consentimento, identidade de gênero, disfunções sexuais, aborto e bullying são discutidos sem rodeios. É uma abordagem necessária, considerando que a educação sexual ainda é um tabu em muitas partes do mundo.

Representatividade de verdade ou apenas um check-list?

Sex Education é celebrada por sua diversidade, trazendo personagens LGBTQIA+, diferentes etnias e realidades socioeconômicas distintas. No entanto, a representação em si não é suficiente para garantir profundidade. Embora alguns personagens tenham histórias bem desenvolvidas, há momentos em que certas abordagens parecem cumprir uma cota de inclusão, sem um aprofundamento real.

Por exemplo, Eric, melhor amigo de Otis, é um personagem negro e gay que desafia estereótipos. Seu arco narrativo explora a homofobia e a busca por aceitação dentro da própria família. No entanto, outros personagens não recebem o mesmo tratamento. Muitas histórias são iniciadas, mas nunca são plenamente exploradas, dando a sensação de que a série tenta abraçar uma pluralidade tão grande que acaba não desenvolvendo tudo de maneira satisfatória.

O feminismo de Sex Education

Um dos pontos mais elogiados da série é seu compromisso com uma narrativa feminista. A série desafia convenções ao colocar o prazer feminino no centro das discussões. Personagens como Maeve Wiley e Aimee Gibbs representam diferentes facetas da jornada feminina, abordando desde o empoderamento sexual até a violência contra a mulher. A cena em que um grupo de alunas compartilha experiências de assédio e percebe que todas passaram por situações semelhantes é um dos momentos mais potentes da série.

Entretanto, fica a questão: até que ponto a série está promovendo um discurso autêntico e até que ponto está apenas surfando na onda do feminismo comercial? Muitas produções têm capitalizado em discursos progressistas sem realmente se comprometerem com a causa. Sex Education se diferencia por trazer mulheres no time de roteiristas e por abordar o prazer e a autonomia feminina de forma natural, mas, em alguns momentos, a sensação de forçação está presente.

A crítica ao puritanismo e a falta de uma verdadeira revolução

Em tempos em que o puritanismo parece ganhar espaço novamente em algumas sociedades, Sex Education é uma resposta contundente. A série desafia moralismos ao tratar de temas que muitas vezes são silenciados. Entretanto, é curioso notar que, ao mesmo tempo em que se propõe a desconstruir tabus, ela também reforça um formato que já se tornou previsível dentro das produções contemporâneas.

A ambientação mistura elementos britânicos e americanos, criando uma estética estilizada que, embora visualmente atraente, por vezes distancia a história da realidade. Esse híbrido cultural, aliado a personagens que, apesar dos conflitos, sempre encontram um desfecho relativamente otimista, faz com que a série pareça mais uma fábula moderna do que um retrato realista.

O legado de Sex Education

Mesmo com suas inconsistências, Sex Education é uma das produções mais impactantes da Netflix. Seu sucesso não está apenas na abordagem de temas relevantes, mas na capacidade de gerar discussão. Ela serve como um pontapé para debates sobre educação sexual, diversidade e inclusão, temas que ainda encontram resistência em diversas sociedades.

Porém, é importante reconhecer que, apesar de ser um avanço, a série não é uma revolução. Sex Education faz parte de um movimento maior de produções que estão buscando representar melhor a pluralidade humana, mas sua abordagem muitas vezes fica na superfície.

O que fica, no fim, é um questionamento: a série realmente desafiou estruturas ou apenas se encaixou no padrão de inclusão que já se tornou um “selo de qualidade” para o entretenimento moderno? De qualquer forma, o impacto de Sex Education é inegável, e seu papel na formação de uma nova geração mais aberta e informada sobre sexualidade será lembrado por muito tempo.

Priscilla Kinast
Priscilla Kinast
Artigos: 13

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *